''No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.''
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.''
Provavelmente, você já conhecia esse
poema, não é mesmo? Ele é de Carlos Drummond de Andrade, que, há exatos 115
anos, no dia 31 de outubro de 1902, nascia na cidade de Itabira, em Minas
Gerais. Naquela época, ninguém fazia a mínima ideia de que esse nome se
tornaria um dos mais importantes da Literatura brasileira. Drummond destacou-se
na segunda fase do movimento Modernista brasileiro, ao lado de outros
escritores como Cecília Meireles e Vinicius de Moraes. Dentre suas principais
obras, estão ''A Flor e a Náusea'', ''Poema de Sete Faces'', ''Quadrilha'',
etc.
Sem dúvidas um de seus textos mais
conhecidos, ''No meio do caminho'' (apresentado acima) expressa os obstáculos
encontrados nas vidas do eu lírico, que os comparava a pedras. Cansado desses
problemas, o eu lírico também revela que eles podem significar algo importante
e marcante. Por esse e outros motivos, essa obra é tão conhecida e parodiada,
muitas vezes por pessoas que não compreendem bem seu significado, já que
acreditam que Drummond retratou uma rocha real em seu caminho.
Apesar de ser bastante conhecido
pela sua vertente poética, esse ilustre escritor também apresentou obras em
prosa, sobretudo crônicas. Algumas deles estão reunidas no livro ''Boca de
Luar'', publicado originalmente em 1984. Utilizando uma linguagem simples, de
fácil compreensão, e abordagem de diversas temáticas, desde o existencialismo
até questões sociais e amorosas. Todas as crônicas reunidas nesse livro
conseguem envolver seu leitor. Umas alcançam um determinado tipo de público,
outras, outro público. Como de costume, a obra também possui textos que evocam
as memórias, característica típica de Drummond, com ''Milho cozido'' e ''Coisas
lembradas'', por exemplo. Porém, em comum, todas as crônicas utilizam da
linguagem e do vocabulário como elementos tão importantes quanto os
personagens, aproximando ainda mais os leitores das situações apresentadas.
Para representar esse livro que
reúne crônicas tão primorosas, escolhi um fragmento retirado de ''A estranha (e
eficiente) linguagem dos namorados'', que se inicia com um casal trocando
apelidos inusitados:
''Diálogo aparentemente
louco, mas que dois namorados de imaginação mantêm todos os dias, com estas ou
outras palavras igualmente mágicas. Não inventei nada. Apenas colecionei
expansões ouvidas aqui e ali, e que me pareceram espontâneas, isto é, ninguém
deve ter preparado antes o que iria dizer, de tal modo as palavras saíam
entrecortadas de risos, interrompidas por afagos, brotando da situação. O amor
é inventivo e anula os postulados da lógica. Ele tem sua lógica própria, tão
válida quanto a outra. E os amantes se entendem sob o signo do absurdo – não
tão absurdo assim, como parece aos não-amorosos. Já ouvi no interior de Minas
alguém chamar seu amor de “meu bicho-do-pé” e receber em troca o mais cálido
beijo de agradecimento.''
Nesse pequeno trecho, podemos
perceber mais uma vez a capacidade incrível de Drummond de criar um diálogo ainda
que sutil com o leitor, criando uma noção de proximidade com ele.
Embora tenha publicado uma grande
quantidade de obras em prosa, Drummond teve maior destaque na poesia, abordando
temáticas sociais e até metafísicas. No poema ''Confidência do Itabirano'', ele
traz lembranças de sua cidade natal, a mineira Itabira, localizada no
Quadrilátero Ferrífero. Nele, o eu poético expressa a maneira como a sociedade
e a sua cidade influenciaram para a sua formação enquanto indivíduo, tornando-o
mais sério, mais sofrido, como nesse excerto:
''Tive
ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!''
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!''
Outro livro que reúne grandes obras
desse escritor é ''Simplesmente Drummond''. Esse livro foi publicado em 2002,
declarado pelo então presidente como ''Ano Nacional Carlos Drummond de Andrade'',
celebrando seu centenário. Quinze anos depois, algumas cidades e instituições
homenageiam o poeta. No livro, estão reunidos conhecidos poemas seus.
Existem muitos outros poemas preciosos
de Drummond. Por isso, não é válido colocar todos esses aqui. Caso queira conhecer mais alguns
poemas, clique AQUI para conferir textos
como ''José'' e ''Poema de Sete Faces'', que deveriam ser lidos por todos os
amantes da poesia e até por aqueles que não gostam tanto do gênero. Como não se
encantar por Drummond?
Ninguém é igual a ninguém. Todo o ser
humano é um estranho ímpar.
(Carlos
Drummond de Andrade)